Estes Contos de cidadezinha provam – mais uma vez – a extrema qualidade literária de Ruth Guimarães. São histórias contadas à maneira tradicional, com muita técnica mas sem pirotecnias narrativas. Ao reproduzir a fala acaipirada de seus personagens, Ruth confere ao texto um sabor único de vida interiorana sobre a qual ela amorosamente se debruça. Mergulhamos em um mundo distante, no tempo e no espaço, daquele encontrado nas grandes cidades. Um mundo em que o resultado do jogo de bicho, um bate-papo entre desconhecidos no trem, ou um pedido de casamento ainda são acontecimentos – ou, em termo cunhado pela autora, “acontecências”.
Em resenha publicada no jornal O Estado de S. Paulo, por ocasião do lançamento (1996), o crítico José Paulo Paes reitera como é possível perceber, nos Contos, a “felicidade com que a contista logra capturar o ethos da vida na cidade pequena.”
Neste livro, Ruth Guimarães elabora questionamentos sobre o seu papel no mundo, como escritora, e estabelece a sua profissão de fé: "Escrevo para quê, afinal? Para obter honra e glória? Para poder dizer tudo o que penso? Para me aproximar do meu semelhante? Para tentar derrubar o muro que separa um ser de outro ser? Para apreender o sortilégio da vida, que de outro modo não alcanço? Para justificar esta minha existência? Então será para mim mesma que escrevo? Ah! Eu conto histórias para quem nada exige, e para quem nada tem. Para aqueles que conheço: os ingênuos, os pobres, os ignaros, sem erudição nem filosofias. Sou um deles. Participo do seu mistério. Essa é a única humanidade disponível para mim. Quem me dera escrevesse com suficiente profundeza, mas claramente e simplesmente, para ser entendida pelos simples e ser a porta-voz dos seus anseios”.